terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Deixa?

Desliguei a tevê, liguei o player. Nele a música mais fantasiosa. Não me recorda de você, mas me faz querê-lo perto. Bem perto. O álcool subiu à mente e anestesiou a solidão, intensificou a vontade de. Quero dançar... Para você. Deixa? Fechar os olhos, soltar os cabelos, remexendo o quadril no ritmo da música e sentindo o tecido da roupa roçar em minha pele, enquanto me dispo. Libertar-me da blusa, da calça; abrir os olhos lentamente e lhe vigiar por instantes. Inocentemente, desfilar rebolando em frente às suas fuças. Talvez, aspire meu perfume floral espalhar pelo quarto, menino. Mas quero mesmo é que me agarre pela cintura, afogue seu rosto em meu cangote, sinta meu corpo oscilando em tê-lo próximo e pedindo-o por inteiro entre lençóis. O beijo sedento, o seu olhar encarando minhas feições e minha boca entreaberta exigindo-o teso em mim. Ah, a imaginação!


Bárbara Farias



"Esse Barraco paradinho me deixa um vazio enorme, esse texto é de um amiga Ella en Palabras, é o blog dela, recomendo, vale muito conhecer."

terça-feira, 27 de julho de 2010

Os Cinco lados da Moeda

Qual é a coisa boa do lado ruim?
O pão quente ou o gergelim?
O orvalho na cidreira ou no alecrim?
A farinha, o aipim, a vaquinha e seu capim.
Vermelho de Rubi ou Verde de Jasmim?
Paula Palhaça ou Mônica Manequim?

Quaisquer coisas além de mim
Samba rock, ou algo assim
Não pode mover meus pés
Nem tocar meu tamborim
Nada nunca além de mim
Aluísio de Machado
Azevedo de Assis
Não pode recitar no meu sarau
Nem beijar um querubim

E o lado ruim da coisa boa?
Tá em Madrid ou em Lisboa?
No cacique ou na leoa?
Na tempero da patroa?
Ou é Mulata boa de bunda
Ou a bunda da mulata boa?

O lado bom da coisa ruim
É sambar bem miudinho
Tomar água de canudinho
É beijar devagarzinho

E o lado ruim da coisa boa
Isso eu não sei...
...só vivo a toa
Cada dia pra mim
Tem uma coisa boa do lado ruim.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Além do Sorriso

Fim de tarde. Criança em instantes de lição de casa. Mesmo sentindo um gostinho estranho, ela sorria e criava carinho com as palavras enquanto escrevia. Era brinquedo novo nas mãos: conduzia as palavras com o mesmo zelo-brinquedo com que passeava suas bonecas na prainha.

Era hora inédita, divertida, momento em que a doçura da boca descobertava de um modo diferente, desprendia-se em uma única ponta. Depois de um curto intervalo, terminara a redação fazendo piada a partir do consolo do irmão mais velho:

"Relaxa, maninha! Há mais do que as casinhas de dentes no sorriso: não esquece do bafinho e dessa saliva que sempre te lava a voz: são tudo um caderno de caligrafia solta: juntos vão desenhando a bênção da tua assinatura, na língua."

Ainda sentindo um arfar de ar correr da janela miúda, o feitiço seguia todo nas mãos meninas. Dizia ela, refeita do susto da escrita, batendo o pé toda orgulhosa do que em si descobrira.
"Não teve varinha nem 'salinha' de fada nenhuma..."

(Voara, além do sorriso e da palavra da boca da pequenina, o estalo de um dente de leite, que tombava na escrivaninha.)


Cel Bentin

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Ponderações

A vida do filho ainda segurava seus pés na escada

Na corda descansava o peso insuportável de sua desgraça

E não havia amor que desfizesse o nó na garganta.
.
André Ulle

[minimizando o tempo de ausência de postes]

sábado, 11 de abril de 2009

Voltando a esta estúpida mania
de querer poetar sem medida,
lacrei meus sentimentos estourando
em mim várias feridas
que já haviam sido cicatrizadas
com a ausência da poesia.

Mari'schurr

Engenharia Reversa

O marceneiro talha a forca e o berço,
O químico concebe o veneno e a cura,
O vigário que beatifica, desconjura.
E a mão que iça a lança, reza o terço

A sombra que traz o medo dá o abrigo.
No azul que cobre o céu cruza o fogo,
Do chão que brota o verme vem o trigo
E a mão que dá as cartas, finda o jogo

O mesmo Deus que perfilha, ignora.
A poesia que transcorre se desgasta
E a palma que se cerra, nos implora

A mão que dá o nó arquiteta o corte,
A que diz de amor, ergue a vergasta
E a que conta a vida, versa a morte

Jairo Alt

O Pulo

Nela um querer de ir
Hesitante diante o medo
Na sua mala vazia
A sua paz roubada
Sem mais segredos
No fundo um nada
Maquiagem manchada
Palpitante descompasso
No seu relógio de pulso
A sua hora marcada
Uma mentira da confusão
Seu conflito particular
E la senta e chora

Tamara

Void

Minha solidão é cardíaca
Roubou o som do meu peito
Levou de mim até as lágrimas
E ando vivendo seco

No desespero tentei gritar
Mas o eco não volta
E os rostos na rua
Mais parecem cartazes
De antigos carnavais

Rostos de vidro
Pessoas de areia
Qual valor das coisas simples ?
Qual o valor da vida alheia ?

Acho que nenhum
Sentimentos são falhas
Para um homem invisivel
Num mundo de pessoas imaginárias

Daniel

sexta-feira, 27 de março de 2009

A Lira

Taís era sempre fiel
Brisa escapou pelo ar
Nayara fugiu à Bahia
Kalliny chegou pra ficar

Jane dançava um Alceu
Vitória acabou de chegar
Chris encontrou-se com Deus
E sei que não posso voltar

Bruna era carpe diem
Com Endie eu ia casar
Laurinha beijei uma vez
Maria não pude beijar

A vizinha eu nunca agarrei
O pai não iria deixar
Era grave pastor do Rei
E a filha princesa do mar

Joana eu quis mas nem sei
Das carecas eu gosto mais
Ayla é minha até que
As amigas cheguem no bar

Thiago eu até afaguei
Roberto tentei beijar
Túlio até me comeu
E pedro só quer farrear

Luana foi a tal que beijei
Antes de saber beijar
E com Kelsei foi que aprendi
Que todo amor bom é fugaz

Para Andressa eu me entreguei
Antes de saber me entregar
E com Andressa um mundo criei
E sem ela vi ele acabar

Nah é a amiga do peito
Com ela eu posso chorar
Basílio, um safado sem jeito
Me vê e já quer me agarrar

Marina foi só outra vez
E eu tava doidim de lascar
Cidão não a deixa esquecer
Se alguém começa a lembrar

Com Isis fui frouxo sim
Perdão, não soube te amar
Com Lydia é assim assim
Gosto e não posso gostar

Kilma é que foi o meu fim
Beijou e disse: nunca mais
Era só um gostinho de mim
Pro teu paladar de rapaz

E de tanto amor nessa lira
A quadrilha vive a rodar
Como uma ciranda na ilha
Como um Deus pairando no ar

Mas Isabel é a maligna
Só ela me fez chorar
Só ela viu meu pranto
E foi sem olhar pra traz

É Isabel quem me faz sofrer
É Isabel quem me faz cantar
E cada linha de verso meu
Cada linha de verso será

Como cada amor dessa lira
Cada amor deixou-se amar
Para que eu ame a menina
Que parte ao me ver chorar

Amém

Diogo Testa

Mulher Guerrida

Ah! Mulher aguerrida...

Alma casta e não se sabe o fenecimento que te inflige à vida
Nasceu das cinzas firmes que te conduzem pelas mãos
Formou-se guerreira e no coração se faz em obra dura

Não foi formada em fantoche, mas, moldada aos ossos
A perfeição divina, bela e sábia, predestinada a que veio
Dela, depende a edificação da lida da vida
Instrumento, para intervir neste mundo cão.

Frágil, diante da imperfeição da pedra bruta
Faz-se forte frente aos inimigos vorazes
Guerreira caminha só, desde jovem a imortalidade
Traz nas entranhas tuas absurdas valentias e,
Não teme a obscuridade e nem os laços armados

Cinja-se com o fogo e faça acontecer o teu caminho
É o acaso aceso que aclara vidas e espreita sonhos
Nas nuances resplandecentes do teu arco-íris

O que é certo é que é encanecida com tuas imputações
Mas, acima de todas às tuas lutas, a tua personalidade
As superações e as gotas de lágrimas sentidas

No teu espaço e em tuas desventuras...
O prazer e a plenitude do teu cheiro em um só dia
Flor frágil e forte neste jardim amanheceu

E o que a torna tão (in) segura?


Sonia Cancine

quinta-feira, 26 de março de 2009

Em retalhos

cansa a beleza
mente também

é o coração então
em retalhos

remendado com linhas de costuras
frias

Lucas Oliveira

(Com Michelle M)

Frevo Folia

Em passos leves as pernas flutuam
Com um significado maior que a vontade
Um ritmo que não tem outro igual
Que saí na avenida, que deixa saudade


Vindo da Terra dos Altos Coqueiros
Salve o frevo que ferve nas veias
Salve o frevo que é de verdade.

(João Solrac Diniz)

Uma pequena homenagem a um dos ritmos da minha Terra
Pernambuco, Terra dos altos coqueiros!

terça-feira, 24 de março de 2009

Redenção

Rio

De tantos janeiros

Redentores são

Teus filhos

Que lutaram e lutam

A espera de teus braços abertos

Hoje

Na imagem do Cristo

Misericordioso

Que do alto tudo vê e

Chora

Sobre a Guanabara

Silencioso

ɱαгЇS

A Red and Blue – palhaço bicólor.

I
O colorido menino régua
circula o espaço
com compasso
sem dar trégua.

Colorido menino regra
no fim do dicionário
acha extraordinário
palavra que nada agrega.

O colorido menino treva
de pensamento atado
ao estilo afetado
desenha palavras cegas.

II
O colorido menino puta
veste as partes
de sua arte
enxuta.

III
O colorido menino esperto
todo conhecedor
só conhece a dor
do difícil discurso direto.

O colorido menino ereto
na estrada burra
urra
o canto caquético.

Bruno

Navalha


Ninguém de perto conseguia realizar meu pedido. Parecia que estava em um mundo diferente, onde ninguém sabia de nada sobre o assunto. E todos os cursos não eram suficientes. E que aquilo fosse absurdo da minha parte. Mas não sou louca por fazer isso. É tão lindo e estiloso. Em mente o destino era seguir rumo a Curitiba, caminho longo demais, mas valia a pena. Lá é tudo diferente, moderno .. simples! As pessoas que iam passando na rua era normais, pelo fato de se aceitarem como são. E ao sentar naquela cadeira arredondada, me olhando no espelho, uma tristeza ia surgindo, e a cada corte de navalha aumentava ainda mais a minha agonia. Aquela loira até que foi com minha cara, mas a do lado ainda me olhava esquisito. Eu pensando então: - ela deve de me achar doida - e o processo seguia, a navalha não estava afiadíssima como de costume, mas o resultado foi ótimo, e depois toda aquela sensação ruim foi passando. Ao final, fiquei surpressa. Loiras, não são menos inteligente, para não usar uma expressão agressiva. Há um talento escondido em algumas. E depois, cortar o cabelo não é tão ruim assim.

Breila Marcante

Alma

Minha alma não anda mais em mim,
Porque fui por ela tão esquecida?
Será que foi se encontrar, enfim
Com outra alma igualmente a ela entristecida?

Diz-me alma “minha”, porque me esquece,
Onde quer que estejas ouve a minha prece,
Volta para este ser triste alma querida,
Volta para esta mente insana, enlouquecida.

Dou várias voltas dentro da minha cabeça,
Sinto medo que meu pensamento me enlouqueça,
Não sei como bate o meu ignoto coração,
Condenado a viver dentro deste podre caixão.

Na minha vida a somente uma beleza,
Que às vezes disfarça-se como minha tristeza,
Corro para todos os lados dentro de mim,
Porque alma, a minha vida tem que ser assim?

“Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão de meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!” *

* 1ª estrofe de “Fanatismo” – Florbela Espanca


Augusto Cerberus 1/7/2008 41ª

quinta-feira, 19 de março de 2009

Chico no Chão - Letra de música

Queixou-se Francisco, o Chico
cisco no olho da paixão
belisca amor, feito petisco
tomando cachaça com limão

palma na calma, um chacoalhão
tapa na orelha, vermelha vergão
caxeta na mesa, surpresa ladrão
pipoco, troco, chumbo e tostão

deu briga no boteco
no jogo de marreco
Disparo do Maneco
Chico no chão.


Arthur Vital
27.12.2008

Sobre a Fraqueza de Amar o Impossivel

Um Amor de Verão ( O Sol e a-mar)

Não havia nada que me cegasse tanto quanto os reflexos do seu brilho batendo contra as ondas da praia.
Fiquei sentada ali, completamente inerte em meio aquela floresta de pedras, apenas observando aquela luz que subia de acordo com a maré batendo nas rochas e molhando minhas pontas dos dedos.
Quando enfim chegou a tarde e aquele astro gigante foi se deitando sobre a água, era explicita a paixão dolorida daquele gesto que até mesmo o céu se redimiu e aceitou ser colorido em tons alaranjados, pintando a paisagem de mais um amor impossível, enquanto o sol beijava as ondas.
Meus olhos turvaram-se diante de tanta luz, e foi preciso ouvir o silêncio, o vendo chegar de olhos fechados.
Tão grande, o Sol num sinal de amor imenso debruçava-se sobre as águas salgadas, fazendo-se pequeno e dando espaço às estrelas acompanhadas da escuridão, esvaindo-se só pelo horizonte, convidando a lua a cuidar da sua praia.
O sol gemia, como se fosse uma tortura mortal ter que deixar de estar a pino brilhando sobre aquele oceano.
Quando a noite veio e ele gritou mudo toda a sua fraqueza perante seu amor, eu pude ver o quanto o sol era apaixonado pelo mar.


Ingrid Regina.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Tina

Na tina de lavar roupa, um negrinho se agita com a água fria.
A mãe entoa canções calmas que o vão acostumando e, com as mãos em concha, vai molhando os cabelos ralos da criança. Enquanto esfrega, balançam seios secos e pendentes.
O pequeno se diverte fazendo splashs com as mãos. A mulher o afaga emocionada, molha seu rostinho e, num cálculo do desespero, pressiona-lhe a cabeça para fundo d’água. Chora orações que aprendera com seus antepassados afundando-lhe mais a cabeça.
Um homem entra, também chora, convulsivamente:
- Acabou?
- Acabou. – respondeu-lhe a mulher.

Alexandre Cruzeiro

terça-feira, 17 de março de 2009

Almoço

Depois do almoço, limpou o sangue que gotejava de seus lábios, suspirou saciado, bebeu o resto da cerveja Bossa Nova que jazia quente, apoiou as costas na madeira podre que servia de encosto e observou, na estrada deserta em que o calor era visível através dos gases que subiam do asfalto, um escorpião rastejar com dignidade. Ela era boa. Nunca teve raiva dela. Encaminhou-se até o freezer e puxou mais uma cerveja. Estava gelada. Alguns quadros pendiam tortos das paredes. Mostravam um casal feliz. Preto e branco. Na radiola girava um disco antigo. Ele achava que os discos antigos tinham um romantismo que os aparelhos modernos não conseguiam reproduzir. Billie Holiday. Summertime. Alternava demorados goles aos sutis gestos de satisfação dos músculos da face. Não estava arrependido. Lembrou-se da noite anterior. Confusas imagens lhe vieram à tona. Sua mulher fazia sexo anal com um dos clientes. Gemia. Agora não lhe importava mais. Propositalmente terminou a cerveja no mesmo instante em que aquela música terminava também, jamais chegando à outra faixa, devido aos arranhões. Lá fora, deu partida ao Opala SS, 76, vagarosamente, atropelando, com prazer refinado, o inseto, cuja pontiaguda cauda retorcia-se em espasmos violentos. Observava-o do retrovisor e seus olhos adquiriam um fulgor de excitação. Saindo da jurisdição, viu cintilar sob o sol daquele sábado: “Serra Talhada - 137 KM”. Abastecendo no posto próximo, deu carona a uma adolescente de cabelos encarnados que chorava, contava sua estória e dizia que seu pai era muito bruto. Ele a consolava entre gentis galanteios. Esforçava-se por demonstrá-la o quanto seu pênis latejava enrijecido. Sentia-se feliz. Jamais voltaria àquele lugar novamente, onde os membros esquartejados de sua mulher amontoavam-se dentro de um freezer, junto às garrafas de cerveja barata. Servira-lhe de almoço.

David Moura

Se eu morresse amanhã

A trova que não se divide

Se eu morresse amanhã,faria hoje, tudo o que ontem não fiz.
Furtaria flores do quintal do vizinho.Embriagaria ao próprio teor alcoólico com risos maltados de hálito cru. Secaria o amor com minha sede.
Deitaria meus versos em rede.

Se eu morresse amanhã, tentaria ser mais sábia em aspéctos específicos e menos lúcida em alguns banais.Não soltaria o que me escapou. Retomaria o que sem querer perder, perdi.
Amaria sem cautelas.Perdoaria mais.Veria em câmara lenta o cair de uma folha ao chão, o vagar da mesma ao vento.Não sentiria "infelizmente" o perfume da flor, pois não me foi dado este sentido...mas a beijaria!
Deixaria a chuva cair sobre meu rosto, que é prova real e constante, de que estamos vivos.Terminaria coisas começadas e estaciondas ao longo do caminho, como que cansadas da espera de resultados. Ah...eu meteria os pés descalços na terra úmida...Secaria os cabelos ao sol!
Tentaria de novo aquele amor...investiria mais neste último, que de último, não sei quanto tem.

Ah...mas se eu morresse amanhã, o dia hoje, seria curto para realizar tantos feitos!-Por isso, vou tratar de começar agora...estou viva!

Ainda há tempo para a flor, o vento, a chuva...terminar projetos...perdoar mais. Ainda dá tempo de amar, investir nesse doido: "O amor"...roubar beijos e a flor do vizinho. Além do mais...vai que amanhã eu morro?
Então, vida...espere!-Estou indo!

Rosana Lazzar

sexta-feira, 13 de março de 2009

Aborto

Deixo a palavra fria
escorrer por minhas pernas quentes
e recebo a agonia
com meu amor, com meus presentes.

Esse seria um momento tão lindo
se o que estivesse pra nascer
não já surgisse findo.

Mas que seja! - desatino
é meu carma, minha sorte - é destino.

E deixo o verso escorrer
como memória viva do que poderia ser.
E me deixo em transe, absorto.
A cada palavra, um aborto.

Eric

Práticas antigas

Eu dançarei sobre teu túmulo
Paganismo inerte
Música que aprendi de ouvido
no pulsar envenenado
que me perverte
mas sustenta o fôlego

Desfarei no giro dos quadris
A mandinga e a modorra
que lançaste-me sobre a libido
Terei teu jazigo revolvido
e até o verme cuidarei que morra
sob as coreografias febris

Ocorre que as hordas infernais
são palavras esmurrando minha porta
e as logro no encanto das cantigas
E entre ritos novos e práticas antigas
vislumbro-te carne exposta
nas manchetes dos jornais

Breve dançarei sobre teu túmulo


Iriene Borges

quarta-feira, 11 de março de 2009

"Santa Ceia"

Que eu provei o vinho doce
Me embriaguei de álcool,
De mim
Bebi da minha saliva
Cuspi diariamente teu sangue
Que também me vazava pelos poros

Do teu chão arranquei meus joelhos
Sai da aridez da tua terra
E me lancei no mar
Desconhecido
Liberta(dor)

Chorei meu sal
Das inundações das minhas trompas
Da saída a entrada
De toda água que consumia
Filtrando
O mar

E nadei,
Nadei.
Por onde eu quis
Pros mesmos lugares
Até os braços
Cansarem e me deixarem
Comendo o sal
Das minhas lágrimas.
E
Sem mais forças
Com pulmão salubre
Regurgitei mais sal
Imergi em meu mar

Acordei na praia
Na mesma superfície arenosa
Caminhei de joelhos novamente.
E pra aliviar os meus pulmões
Do fogo do pecado.
Bebi do teu sangue
que agora me era inflamável

E vieste de braços abertos
, quando engoli teu pão,
E te senti descendo na garganta
Por inteiro
Carne, sangue, unhas e pêlos.

André Ulle

Aplausos e sussurros

deve haver outros fervores otimistas
desses arrebatamentos de uma fé inesperada
desesperada e ingênua mas capaz de acender luzes
e perfumar teu entorno de lavanda de outras vidas

de vida passada a limpo no medo do mal de agora
da hora dos vultos fátuos de sombras e sons dispersos
que clamo que me conduzam prum reino de homens alegres
de risos de rostos jovens de sol e algumas canções

que expulsem rancores foscos das velhas casas de infância
bruxa de joão e maria em luxúrias mais que em doces
de homens tão solitários como és em teu segredo
de fadas, fatos e fodas e trilhas de vãs migalhas

que corvos escabelados comeram só por deboche
cravando teus pés a estrada de teus passos movediços
e às épicas cenas pobres de memória empoeirada
encenadas com vergonha em tom de calamidade

e teu olhar desconfiado pro falso poema-ato
já farto de alguns pavores prefere escutar aplausos
e ao invés de meus sussurros e lamentos carpideiros
meus gritos de bis e bravos e o orgulho de tê-lo ao lado

Cado Selbach

Maldição acumulada

Hoje nada canto
a vontade se esvai
maldição acumulada
minha vida se desfaz
em mau logradas tentativas
com somente um parecer
de que nessa vida
hei de sempre eu sofrer
exagero, logo muda
diz a mão que me acarinha
essa mão tão jubilosa
essa mão pequenininha
que esconde tanta força
outra vez me joga ao chão
o carinho vira tapa
o amor, decepção
tudo morre, nada basta
para esse coração.

Ohzemesmo

Redenção

Gosto dos teus cabelos
Desgrenhados, aliciando
Rente ao faro de teu corpo,
E do modo como me olhas,
Eriçando de um salto, os meus.
Desse teu jeito abstrato,
Que me profere à flor-do-ouvido,
E a minha margem, faz-me vertigem.
Gosto quando intenta minha tez,
E fere magistral meus sentidos.
Quando periga minha clareza
E faz-me vítima do teu aroma,
Suspenso, que flui-se ao meu,
Derramando-se licoroso no ar.
Gosto quando em teus abraços,
Impetuoso induz-me ao deleite,
Saltando-me as veias, em arrojo,
Apontando-me às entranhas.
Quando precipita-me
Em teus recantos,
Elevando-te às profundezas,
Mais encobertas do meu ser.
Que confessam-no,
A fazer-me refém,
Do mais saliente desejo.
Ameaçam-me cativa à tua alma.
Bandido! Eu me rendo...

Cris de Souza

terça-feira, 10 de março de 2009

Sobre o desejo lacinante da dor

Suportam o peso atroz e bruto,
Os punhos a lacerar-se e a pele
A corroer-se. A garganta expele
Seca. O grito de dor do escorbuto.

Vergam-se. Na rigidez de um minuto
A falarem: teus dedos agora flagele!
Num instante ordeiramente repele
A distrofia que leva ao meu luto.

E se não basta tanto enfermo, enfim,
O corpo mostra sua infante fraqueza
E não carece mais de começo e fim.

Da dor imensa que o corpo sente
Também me some toda a defesa
Ao ver a carcaça triste e ausente.

Renato De Boer

Escolhas

Não escolhemos nascer,
mas mesmo assim...
A camisinha estourada,
A pílula esquecida.
Te empurra pro mundo.

Pr'um caso corfimado,
Existe o aborto...
Será certo deixar a
Vida escorrer pela perna?

Não escolhemos crescer,
mas os anos passam,
O corpo modifica,
E somos lançados à vida.

E a infância? Fica perdida?
Numa gaveta da memória
Pra sempre esquecida?
Restam somente saudades.

Escolha bom emprego,
Uma namorada, boa renda...
viagens e passeios...
Tudo na vida, é mediante
às suas escolhas.

Não escolhemos amar,
Apenas somos escolhidos.
Nada mais.

Maraísa Bovary - MB 17/02/09

quarta-feira, 4 de março de 2009

A mulher que falava com os pássaros


Havia naquela pequena cidade de pouco mais de seis mil habitantes, uma mulher que falava com os pássaros. Falava e ouvia. Eles lhe visitavam diariamente e contavam em seus cantos de suas viagens pelo mundo, dos lugares maravilhosos que conheciam. Contavam das matas, dos rios, dos montes e também da crueldade humana, da poluição, da caça ilegal, da ganância.
Ela ficava por horas na varanda de sua casa conversando com os únicos amigos que possuía na vida.
Na cidade, era chamada de louca. Apontavam-na com deboche ou com pavor. Era motivo de piadas e, para os menores, era apontada como perigosa.
Certo dia, alguns rapazes caçaram uns dos amiguinhos da mulher e os jogaram em sua varanda, mutilados e mortos.
Ela ficou terrivelmente ferida em sua alma e então, teve a idéia de avisar o maior número possível de pássaros para que não mais voltassem àquela cidade, sequer a sua varanda. E assim foi por dias, ela avisando seus amiguinhos, que avisaram outros até que nenhum pássaro mais ousou cruzar o céu daquela cidadezinha de pessoas tão cruéis.
Algum tempo depois, ela foi encontrada sem vida, sentada na varanda.
Apesar de dizerem que havia morrido pela loucura ou pela solidão, ninguém que a viu morta jamais esqueceu o ar de serenidade de seu rosto e a candura de seus olhos voltados para o céu.


Malu Sant'Anna

Resistência

Escutei o sol raiando
Ou eram pássaros
No labirinto de minha mente
Um sol guardado
Para que só eu o ouvisse
E vê-lo nunca
Feito desejo irrevelado
Que dentro pulsa
No coração multicolor
De cores lânguidas
De dúbias vontades, criador
Impuras, cândidas
Guardei meu sol em urna mística
Fundida em aço
Impenetrável coração
Dilacerado.

Mariana Ribeiro

terça-feira, 3 de março de 2009

O Título das Forças Cegas

O Título das Forças Cegas
Por mais que eu contasse cabritinhos
Em minha cabeça vinham cabritas,
Todas esfoladas e regadas
Por um banho de gozo e luxúria,
Enquanto isso, um pouco adentro,
Um poço de lamúria...

Nas encostas barulhentas
O medo faz a si mesmo,
Deixando um crítico ressabiado,
Criando um vão retardado
Que engole cada centavo
Plantado no mês.

E por mais que eu saiba
O Título das Forças Cegas,
Custa-me entender passagens
Que não passam de vassalagens
Premeditadas por homens
E um homem mal.

Minha língua me sufoca,
Meus dedos querem um álibi,
Minha perna coça aflita,
Minha barriga me irrita,
Pois ela não consegue digerir
Esta razão maldita...

Augusto Loffredo

Provocação

.

Escapo em meandro,
escopo libertino
de alma penada.

Não te peço nada
tampouco me dou

apenas exponho
entre as coxas roliças
meu preferido
lugar de brincar.


Agatha R.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Para uma alma enforcada

Ao
que não havia
rendido ainda
um poema

Peço tua alma
ao Deus que te guia
ou em qualquer chuva
que se anuncia

Peço força para que
não te escorra
o que já passou
leve por tua pele
um dia

que não morra
entre os teus ossos
[Asfixia]
esta alma
igual a minha

Giulliana Missel

Chuva

Sobre uma casa morta onde somente
a vida sabe-se à luz das alfaias
para sempre esquecidas no creiom
da vida alegre já morta no tempo.

Sobre uma vida incerta onde somente
a lenta maturação das alfaias
do peito apodrece neste creiom
de angústia a fatalidade do tempo.

Para todo o sempre aqui seja feito
sobre a obstrução da vida o silêncio.

Diego Melo

domingo, 1 de março de 2009

O voyeur e a manequim [chanson]

Do outro lado da vitrine
manequim
dans le atelier
você me olha assim
mesmo sem me ver
com seu charme plastificado

nosso amor é delicado
manequim
quero só você
não quero a modelo
que lhe empresta o molde
que lhe empresta o gesto afetado

me iludo
quando penso em levar você pra jantar
no boulevard em Paris
contudo
meu prazer é voyeur, é te observar
é quase o que eu sempre quis

manequim
manequim
na champs elisée
à disposição
turva minha visão
com seu ar blasé entediado

nosso amor não tem pecado
manequim
de fibra de vidro
nous sommes seuls ensemble
quando estamos sós
inventando uma alma pra nós, sim!

me iludo
quando penso em levar você pra jantar
num boulevard em Paris
contudo
meu prazer é voyeur, é te observar
é quase o que eu sempre quis

Pedro Bizelli
http://www.myspace.com/osskywalkersbanda

Mulher-água

Volúvel, misteriosa
Alma dos mais profundos mares
Nas mais altas núvens
Multi-face em todo tempo, majestosa
Evaporando emoção
Chovendo sentimentos
Percorrendo o mundo inteiro,
nas veias abertas da erosão
Corroendo a superfície do homem
Deixando marcas no coração

Ian Salvador

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

EXPERIÊNCIA INACREDITÁVEL

Percebi naquele instante que toda a minha vida estava sendo dita por aquele homem que jamais vi. Esperei para sentir a presença tão ditada do Espírito, e na espera presenciei de uma experiência única que mudou completamente a minha vida.
Não tive como duvidar, então entreguei meu coração aquele sentimento imenso de paz e alegria e tão sobrenatural que lacrimejaram meus olhos de maneira incontrolável e abundante.
Enquanto o espírito ia lavando minha alma, meu coração, enchendo minha vida de muito amor e paz, meus olhos escorriam lágrimas doces de gratidão profunda, por ter sido uma das ovelhas escolhidas pelos campos da vida.
Percebo que mais do que ovelha sou filha que tem um pai amoroso, zeloso que muitas vezes me dá coisas que nem mereço. Não há lugar em mim que não tenha um sentimento de amor, gratidão por ter sido uma das poucas escolhidas a ter essa experiência espetacular.

E para os leitores que não sabem que estou falando, é o batismo do Espírito Santo.
“Se você ficou interessado no assunto é porque Deus tem um projeto em sua vida, e mais dia ou menos dia ele irá revelar a ti. Fale com ele agora e abra o seu coração.”

Mari´schurr

O Palhaço Nu

O palhaço perdeu o nariz e se sentiu nu.

Estava ali, sozinho, no centro do palco, luzes nele, quando se viu assim: nu, sem o nariz.

Nunca a platéia fora tão grande, nunca tantos olhares se dirigiram para ele. E ele ali, nu, e a platéia e as luzes e o palco enorme à sua volta. E ele, centro da vergonha.

E riam e todos riam e riam muito. E ele não achava graça alguma. Só vergonha e constrangimento. E riam às gargalhadas dele.

Quanto maior seu constrangimento, quando maior sua vergonha, mais riam.

Ele só fazia esconder seu nariz com as mãos, como Adão. E se sentia tão nu, ali no centro, mãos cruzadas sobre o nariz, que se viu trançando as pernas, encolhido: algo além do sexo estava exposto.

Estava ali, totalmente desnudo e, em troca, recebia risos, os risos que ele nunca quisera.

Já sem saber como sair daquela situação, viu uma criança escapar da platéia, correr ao seu encontro e lhe pular nos braços. E foi obrigado a tirar as mãos do rosto, para que a menina não caísse e, assim, lhe pegou no colo.

Ela o olhou bem dentro dos olhos e sorriu:

- Sr. Palhaço, o senhor não precisa ter vergonha. Nós te amamos além do nariz. Não é ele que te faz palhaço.

Ele sorriu, meio desapontado, constrangido, sorriu.

Ela subiu as mãozinhas até seu nariz, para lhe tapar. Suas mãos formaram uma conchinha sobre ele. Bem redondinha.

Depois lhe olhou novamente e sorriu.

Suas mãos eras vermelhas, brilhantes, seus olhos também.

- Palhaço, vai, ria, faça com que riam contigo, da tua arte e nunca mais de ti, da tua vergonha.

E, enquanto falava, ela foi sumindo. Restaram suas mãozinhas vermelhas, restaram seus olhinhos, sempre à sua frente. Sempre que hesitava, os olhinhos da menina anjo estavam ali, sorrindo, incentivando, lembrando que ele devia seguir adiante.

E o palhaço sorriu e riu e gargalhou. E foi tanta alegria, que toda platéia chorou.

Alexandre Spinelli

Palavras

Palavras, não mais que palavras.
Não mais que coisa alguma.
Mas tudo é palavra em suma.
Palavras abocanhadas,
Mastigadas, depois vomitadas,
São palavrinhas mal digeridas
Que tornam a ser palavras
Depois de cuspidas.
Palavras da boca pra fora,
Palavras impressas, versadas,
Palavras sinceras de quem ri
Ou até mesmo de quem chora.
Palavras soltas, aladas,
Perdidas em meio a outras...
Palavras muitas, palavras poucas,
Ricas, pueris, bem articuladas,
Aquelas com gostinho de anis,
Aquelas que descem amargas.
Algumas escapam da boca,
Outras se perdem na ponta da língua.
Há palavras que vão de vento em popa,
Há palavras que morrem a míngua.
Sejam profanas, benditas,
Adjetivadas ou loucas,
São palavras bem-vindas.
Palavras de tesão ao pé da orelha,
Do sacristão à suas ovelhas.
O mundo cabe em uma palavra,
Só alguns corações que não sabem
Que a palavra amor também os cabe.
A palavra instante é curta,
A palavra espera é longa.
A palavra navalha corta,
A palavra tempo cicatriza.
Palavras, palavras, palavras...
E são tantas as palavras
Que mal cabem na boca.
Mas se você não sabe qual usar,
Cale-se, pois qualquer palavra solta
Pode contaminar o ar.
Deixe a palavra sangrar
Até que escorra poesia,
E mesmo que a boca não se abra
Será a poesia a palavra abracadabra
Nesse mundo de palavras engasgadas.

Jairo_Alt

Embarcado

Dizem que virá no amanhã
Um barco do front do mar
Que vem leve, de longe
Tragado de amor pelo cais
Com seu apego marinheiro
Sobre águas forasteiras
Veleja seu coração
Inundado por aqueles olhos
És mais um naufrago

Tâmara Rabelo

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Papel

A vida é papel
Pelo menos a minha
Nasci em uma folha
E vou morrer em outra

È tudo inútil, veja bem:

Minha identidade
Não me identifica
Meu passaporte
Não me transporta
E minhas notas !
Essas sempre se vão tão precoces

O apocalipse é uma tesoura !
E o paraíso é a imensa fogueira
Da hipocrisia humana.

Daniel.

Nos Ecos de seu peito...

Estenda-me tuas mãos para eu te alcançar...
Enlaça-me e me perverta em ti. Devassa-me
os sentidos. Mas, não te percas de mim.

Disse-me assim:
- tens que me dizer o que aconteceu
Sinto temor de que já me escapastes...

de que o que se passa contigo em relação a mim
sejam, tão somente, fortes impressões –

Deixo-te carícias no eco de meus devaneios
com ardor e desejo de ti. Tento evitar pensar...
Mas, uma força maior me atrai. Sinto tanto tua falta
que (quase) chega a doer. Onde estás?

Eu? Já chorei amargamente na calçada...
À espera de um alento. Ali, tão só, permanecia.
- de maneira tão atroz. Ouvia o vento e gritava

Ah! O vento faz-me gemer ao pensar em ti...

Nada posso fazer neste teu silêncio mortal.
Deixes as lágrimas lavarem tua alma triste
que um dia te servirão de sustento, para continuar....

Vá fundo! Até que as luzes se apaguem, por tão pouco.
Em breve, a escuridão... Não digo trevas
[que se opõe a luz].
Afinal, é o final do trajeto da turva luz... Atira-te!
Neste profundo poço profundo
Leva-me contigo, e faz o vento soprar.
.
.
.
Abstrai-te dessa guerra fria, que te afasta de mim....


Sonia Cancine

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Prece ao oceano...

Eloisa, permita que eu morra nas águas
Não me prenda nos grãos de areia da praia
Permita que eu nade nas ondas salgadas
Permita que eu perca o horizonte de vista
Permita que as algas e a vida no fundo
Me rocem a perna e façam cosquinhas
Permita que eu sinta fome e fadiga
Deixa que eu pense que não há mais saída

Eloisa

Que eu sinta desespero
Que eu queime em angústia
Que eu descubra um mar
Sem ilhas desertas
Que me abriguem como me abrigam
Tuas pernas

Olha, minha amada!
Quão grande são as vagas
E como a luz das manhãs
Parece brotar do pélago das águas
Que eu flutue inane ao longo dos dias
Que passe horas sem mover músculo
Com o calor do sol no peito
E o frio das águas às costas
Desatinado como uma onda
E quando os músculos não mais nadarem
E o corpo não mais suportar a fome
E meu ócio não mais sustentar este corpo
Já fino e podre e roto

Eu morra

Mas me deixa ir para morrer no mar
Não me faz passar a vida na praia
Esperando minha hora chegar
Parado
Eloisa, permita que eu morra
Afogado
Amém

Diogo Testa

Vontade Insana

Queria ser um palhaço
Um palhaço sem graça
Nesse mundo em desgraça
Ser apenas um palhaço
Ser um homem descalço
Andando sozinho na praça

João Diniz

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

NOITE AFOITA

No calor da noite, alheio ao som dos carros,
das lojas
e dos pulsares dos podres corações humanos,

o mar, cheio de merda e misantropia,
se deixava engolir pelo vazio
dos olhos
meus

uma canção de adeus
pairava sobre os prédios enquanto a lua,
em pétalas, se desfazia
pra me iluminar. . .

(um punhado de açucar, lançado ao mar,
não demora muito pra se transformar em sal)

a noite derretia
entre meus dedos.

Lucas de Oliveira

Cerrado

Eis que o amor não chega
Tal qual água
Em plena seca

Solo ácido
Aves voando tão baixo
Feito os sonhos
Dos homens

Os pés
Não percorrem a
Imensa vereda

Desistiram de caminhar

Nos lábios
É o sabor agreste
Que me acompanha

O cerrado
Do meu coração
Em galhos
Retorce a vida
Contra a minha
Natureza


As lágrimas
Que jorram dos olhos
É pouca...

Endureceu-me
A terra
Acostumei
viver
Distante

Rusticamente
Guardada
Em minhas cascas espessas

ɱαгЇS

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Joana

Joana não aguentava
A vida de marmita
Ela que era esquisita
Viu o progresso em uma progressiva.

Joana pintou o cabelo
Comprou maquiagem nova
Trocou o costureiro
Começou na rua Aurora.

Das ruas para revista
Entre cliques, beijos e closes
Joana virou artista
Era a rainha das poses.

Joana perdeu o pudor
Joana ganhou dinheiro
Entre os meu amor
Rodou o país inteiro.

Tinha carro do ano
Casa pagou à vista
A família por baixo dos panos
Joana em cima das pistas.

Joana embarcou na moda
Só pensava em ser gringa
Com um inglês foi para Europa
Mostrar como se ginga.

Joana trabalhou bastante
Mas a grana não dava
A conta do companheiro
Joana é quem pagava.

Em um rápido instante
Desejou uma nova vida
Escorregou do sétimo andar
Cansou da vida de marmita.

Bruno.

Labirinto sem saída

Ainda jovem, mas sofrendo
Uma dor no peito, que não tem solução
Meus medos ainda me perturbam
Volto a ser criança ..

Sinto que tudo que vivi até aqui,
Não passam de mentiras
De uma vida mal vivida
Sem histórias pra contar.

Fico horas e horas me olhando no espelho
Me vejo sem saída, sem conserto
Deixando de lado, os sonhos
As vontades .. a vida!

Sob lágrimas singelas
Minha face suspira
Minhas esperanças, feito pó ..
Evaporam!

Breila Marcante

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Soneto da secretina

Ofício escolhido por prazer
de pernas que se cruzam no estilo
do tato no contato ao entrever
os olhos que eriçam o mamilo

Prazer do cumprimento com presteza
aberta às conjecturas do trabalho
servindo de deguste sobre a mesa
fiel e dedicada ao seu Carvalho.

Que riam as hienas do contrato
fechado e assinado noite adentro
selado em boa língua e fino trato

Aspones e hienas ao trabalho!
enquanto na fartura eu me contento
servindo e degustando o seu Carvalho!

Monica San

Monólogo entre nós dois

Vivo aprisionado na solidão da minha alma,
Amor, a única coisa que consegue a minha calma,
Não consigo nunca um dia alcançá-lo,
Porque nunca consigo ouvir o que falo.

Meus olhos não conseguem mais te ver,
Em tua direção meu pensamento caminha,
Neste elo misterioso que existe entre eu e você,
Nem sei mais que alma é a minha.

Ah! Como gostaria de estar ao teu lado,
Acariciar os teus cabelos, dar-te beijos,
Conseguir realizar todos os teus desejos,
Uma única vez conseguido ter te abraçado.

Como posso um misero dia ser forte,
Colocar todo o meu sangue em uma odre,
Retalhar esta minha carne podre,
Não viver mais procurando a morte.

Diz agora como vou embora,
Já que meus pés não são mais meus,
Já que meus sentimentos são todos teus,
Diz-me Luana, como eu vou embora?

Augusto Cerberus

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Cíume

Feito minha poesia
é meu ciúme
descompassado
avocado à fantasia

Grume o ciúme nas quimeras
irradiando besteiras
feito as letras com pressa
no caminho torto às primaveras
da poesia.


Arthur Vital
http://www.myspace.com/arthurvital

De Quebra

Se há algo que posso dizer ter aprendido na vida, afirmo:
- Escrever foi que não é.

Vejo aqueles que escrevem de alma em alma, pelas gramáticas, pelas rimas, pela literatura, pela língua, pelo amor, pondo de linha em linha as cores de Machado e de Vinicius e de outros tantos. E esses são sábios, e sabem escrever.
Eu ainda não sei o que me falha; se é a má escrita ou a falta de oralidade.
Percebo isso a cada carta de amor mal recebida (ou talvez, nem lida), mas o caso é que por depender de palavras meu benê se torna improvavelmente meu.
É triste pensar, mas não consigo prender-te ou convencer-te por depender de palavras.
Acabo que escrevo mesmo só por acarinhar as letras, movimentar os pulsos...

Se há algo que posso dizer ter aprendido na vida, afirmo:
- Escrever é que não foi.


Ingrid Regina

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Parede

- Meu pai? Ele penteava o cabelo. O dia todo. Tinha uma doença em uns nervos da cara. Não se podia tocar na cabeça dele que já gemia. Mas penteava o cabelo, a despeito da dor. Enquanto penteava soltava uns gritos. Lembro que ecoava pela casa toda, mas ele continuava alisando o cabelo. Uma vez o vi chorando enquanto penteava. A única vez que o vi assim. Morreu ainda com o problema. Quando olhei para o rosto no caixão, conservava a mesma expressão de sofrimento. Diziam que não conseguiram tirar. O cabelo permanecia penteado, com zelo.

- Minha mãe também era um pouco louca – ele continuava. Histérica. Depois da morte do marido, andava de um canto ao outro da sala, com seu vestidinho preto que tinha uma rosinha branca artificial na altura do pescoço. A aparência triste, meio solícita com o destino. Começou a falar consigo depois de um tempo. Continuava andando. Perguntava-me coisas estranhas de vez em quando. Uma vez perguntou:“Onde está o pote de ameixa?”, eu disse que não tinha pote nenhum de ameixa em casa. Ela, então, revirou tudo, esbravejando nos criados. Uma hora se cansou e parou de procurar. Gostava de ameixas. Cresci nesse ambiente, quem cuidava de mim era um dos empregados. Quando minha mãe morreu, eu já tinha uns 23 anos, já de cama, ficava gritando coisas que só ela entendia. Mas sorria. E o sorriso ainda era bonito, apesar de velho e sofrido.

- Quem mais da minha família? Acho que só. – Soltou um risinho triste enquanto olhava para ela, a parede, com medo. Ela o encarava de maneira diferente esses dias.

Alexandre Cruzeiro

Ouvido e Som

De que adianta
Teu sussurrar em cada
Sí-la-ba
Com-pas-sa-da-men-te
Em meu es-tri-bo?
Bi-gor-na, Mar-te-la em meu ou-vi-do.

Cachimbo sem fumo inglês.
Perfume sem ser francês.

Volúpia galopante
Sob tua voz sedenta
Que me unge, não com água benta.
Mas que unta nossos corpos suados
A milhares de quilômetros de distância.

Geme, urra, urge e arrebenta a barreira do som.
Isso, louca, linda, vadia pra mim!
Eu sou só ouvido e som.

Marcos Moura

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Resposta das respostas

“Creio na carne e nos apetites,
A vista, o ouvido, o tacto, são milagres, e cada parte, cada migalha de mim, é um milagre.”

Walt Whitman


Eu nunca me revelo por inteiro,
Estou quanto mais perto mais distante
E escapulo naquele mesmo instante
Em que alguém me julgar em derradeiro.

Eu não sou o que mostra o meu semblante,
Nem meu lar, minha estirpe ou meu dinheiro,
Mas surjo simplesmente verdadeiro
Quando o silêncio é minha voz falante.

E nada mais de mim tenho a dizer:
Não pertenço a nenhum grupo social
Nem às suas regrinhas de moral;

É que de lado às mil perguntas postas,
Eu já trago a resposta das respostas
Em toda e qualquer parte do meu ser!

David Moura

Sorria...

Algumas lágrimas são doces, quando provocadas por emoções sublimes.

Pesadas são as de dor, daquelas que doem tanto, que incham em volta dos olhos...Transfornmam a face. Porque chegam com força e não querem parar. Porque o sal delas todas a correr rosto abaixo, danifica a pele, provoca inchaço.

Mas, lágrimas são lágrimas. Pior, são as que engolimos...As que não nos permitimos sair da fonte. O nó na garganta também dói. E as que choramos em silêncio, por vergonha ou medo de que nos julguem fracos...E [quem] é deveras forte na hora do choro?

-Qual o choro que não chora na hora da dor, ainda que silenciosamente, por vergonha ou não?

-Qual lágrima não corre, mesmo sendo dos olhos para dentro? Ou de "riso" afora?

Já vi risos que choravam, disfarçados...Querendo impor uma fortaleza, que só os egoístas não percebiam, preocupados demais em que fossem agradados, bem recebidos. Porque também a dor dos "outros", incomoda á quem veio rir. Assim como nos sentimos incomodados de chegar sorrindo, onde alguém está chorando.

Eu coloco a "bóia" dissimulada, que seja, para emergir do lago do pranto, se alguém me chegar sorrindo.


Ao entrar aqui, sorria!

Sua alma está sendo filmada!


Rosana Lazzar

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Clara evidência

Você surgiu
manhã de ouro
das madrugadas insones
nas quais me debatia

Entrou pelas minhas frestas
como o dia nas casas

Uma ânsia despertou
sob os beijos do infinito
desmaiado em seu azul

Eu, notívaga, a me dissolver
sob afáveis fios de sol
amei finalmente a vida



Iriene Borges

Deixa o sangue estancar

Hoje decidi sacudir a poeira de meus móveis, de minha vida. Não que eu tenha resolvido me levantar, sair do marasmo, me pôr alegre. Não. Hoje eu revivi as lembranças, não todas, só as que me marcaram mais. Ah, e essa não é apenas uma metáfora. Não pode ser. Essas marcas foram tão profundas e duradouras que doem. Não de uma forma figurada e fantasmagórica, mas de um modo literal e contundente.

Meu espírito dolorido e desconcertado me fez perguntas, então. Por que determinadas vozes e melodias ainda me fazem triste? Não serei humano, capaz de superar os reveses? Não, sou humano, "demasiadamente humano", parafraseio. E começo a pensar que, por tal razão, há coisas que não posso superar, nem descrever.

Não há razão para mentir, leitor, dizer que sou forte, corajoso, desbravador, não. Digo somente as minhas verdades e me camuflo nessas palavras. Sob elas, ninguém jamais me verá o rosto, ou me reconhecerá . Aliás, nem eu mesmo me reconheço.

Abro os olhos, cansado, encerro a música que toca e guardo minhas memórias num canto da estante, para que tomem pó, como se cobrisse uma ferida reaberta com um trapo, a espera de novos cortes.

E deixo o meu passado sangrar, em paz.
Em rubra paz.

Eric Schnaider

Bebidas e outros solventes

Segunda-feira vem cortando meus ossos quase me convencendo que sou forte por conseguir levantar às seis da manhã mesmo com os neurônios derretendo, me dando a sensação de estarem quase escorregando pelos meus ouvidos, multiplicando por três o barulho de tudo.

Degraus, passos, grampeadores, teclas, um bom dia que seja já me é o suficiente pro meu rosto se corromper numa careta ordinária, me fazendo ouvir olhares gritando, narrando e decifrando minhas noitadas, cada ruga vinda do meu vicio, minha alma amassada e minhas marcas.

E nessa dimensão, o que me resta é falta, essa mordida insuportável do vento, uma mordida que não crava, faz um ato contrário, repuxa pele pra fora, fazendo os poros saltarem numa aflição louca. Sinto no ar a boca me pairando frouxa sobre a pele que procura alcançar desesperadamente seus caninos. Tenho marcas doloridas de solidão, contrapondo uns espaços picados pela seringa.

Embora minha curiosidade seja tamanha, o medo me afasta de uma nova experiência arriscada, de um pingo preto nesse mundo alaranjado, que ando mergulhando em uísque (confesso-me CULPADA!), mas é que há tanto do passado borrado no presente, que quase vejo o mesmo do meu futuro, numa exotérica taça de cristal.

Prazer, essa sou eu, procurando desculpas pra beijar mais uma noite nos meus copos cheios de vômito.


André Ulle & Ingrid Regina

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A Casa da noite

a negra voz que agudiza em tons de emoção barata
carrega o bar de passados em vozes que já se foram
e o homem só que destila suor e lágrimas fáceis
comporta-se frente a ela como se ELLA o fosse.

e o vigor da voz que canta na garganta nem tão nobre
traz lembranças quase tristes de viagens nunca feitas
a lugares onde vozes derramavam timbres negros
em melismas e floreios de dor e profundidade

uma hora! já tão tarde! paga a conta e vai embora
pro quarto-sala alugado com pôster de chê guevara
que o olha com desconfiança e certa cumplicidade
torcendo pra que não perca o viço nem a ternura.

e já diante da tela de seu museu de amizades
procura videos antigos de divas em árias tristes
talvez pra banir o peso das velhas fossas de sempre
e evitar que seu mundo caia em vozes conhecidas.

e pra driblar certa dose de inútil melancolia
que ameaçava a alegria a qual nascera fadado
dedilha sons de caymmi e sambas cheios de morro
e promete decorá-los pra cantar à namorada.

Cado Selbach

Os assasinos de luz

“São os olhos a lâmpada do corpo. Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso; se, porém, os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas. Portanto, caso a luz que em ti há sejam trevas, que grandes trevas serão!”.

Mateus capítulo 6 versículos 22 e 23.

Há dois dias tenho os olhos negros pairando a menina negra. Dela escorre estranheza, que desliza o meio fio e vai poluindo o resto do cenário, absorve toda a imagem alegre pelo abismo escuro dos hematomas que espalham violência no seu corpo. A imagem dos meninos, das gostosas e tudo que saltitava em cores no ambiente, é sugado pra dentro daquele corpinho de penumbra. A rua se torna assombrada.

Ela só se levanta por atender vozes de inferno, que a chamam pra dentro da casa. Lá vai a menina negra com os passos feitos fumaça caminhando até o bar. Trazendo na mão cigarro e cerveja, hoje diferente de ontem, não aceitou as balinhas de troco, por isso não tem o breve resquício de azul que capturei por segundos antes de entrar na casa, como da outra vez, mas também não tem o borrão roxo circulando os olhos que tinha ontem, ao voltar pra calçada.

Minhas cores vão se atrelando ao portal hostil que a menina carrega na feição, me segura num lacre desconfiado confinado a chacoalhões, tabefes e um desprezo que ela despenca com o olhar tímido permanentemente cravado ao chão.

André Ulle

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Superlativo

Para reticência circular
Entre curvos falsetes
Perfurei um compasso
Que me pendesse

Para entrelinha frisar
Entre turvos verbetes
Procurei um espaço
Que me perdesse

De que me cabe apurar?
Se deparo com incêndio no ponto
Exclamando arranjo
Agravado de cacos

De que me vale riscar?
Se disparo num silêncio remoto
Interrogando rouco
Acentuado de hiatos

Cris de Souza

SE PERMITE

Se permite, eu mudo o verso
que o compasso me alumia
quero volta, um regresso
ver-te em tudo, como via

em teu colo fazer berço
ter seus olhos como guia
esquecer de todo resto
ai meu deus, como queria

Se permite, eu mudo o verso
que o compasso me alumia
quero volta, um regresso
ver-te em tudo, como via

em escuridão tão submerso
vem de novo ser meu dia
da minha vida, ser sucesso
ai meu deus, como queria

Se permite, eu mudo o verso
que o compasso me alumia
quero volta, um regresso
ver-te em tudo, como via

ai meu deus, como te peço
traz pra mim tal alegria
eu te rogo por regresso
ai meu deus, como queria

Se permite, eu mudo o verso
que o compasso me alumia
quero volta, um regresso
ver-te em tudo, como via

Onzemesmo

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Na Aridez do Vento

Na aridez do ventre!


Artérias se fechando e o tecido morrendo..
Enquanto a dor que me toma me mata lento.
Como a dor que sucumbe à laje.Não tenho tempo.
Oprime e na opressão me sobra o tormento!

E nessa ânsia sepulcral. O Espectro da Morte
Me cerca e pune... Ameaçando minha sorte
Sangra a navalha um cirúrgico corte
E essa dor me torna cada vez mais forte!


E eu não morro de vez. Essa dor me consome lento.
Pois até mesmo o mais bruto dos homens,
Ao amar. E perder-se. Há também de sofrer
E deixar-se morrer como areia ao vento!


De boer & Bovary

Anita...

Foi numa tarde bucólica que conheci Anita,
Lembro-me como se fosse agora, jovem e bonita...
Vestida de chita, cheia de sardas e de tranças,
Ficava nos bailes, entretida...espiando as danças...

A moça era de uma jovialidade sem igual,
Era tão inocente, não se distinguia o bem e o mal;
Tímida...de olhos emocionados...donzela faceira,
Que em matéria de energia, aos velhos dá canseira...

Aos 20 anos, tudo mudou...
Voltei a rever Anita..Morava num puteiro, toda carcomida.
Tuas madeixas cintilantes, agora eram cãs...
Nos lábios mirrados, resquícios do batom barato.

Custei a acreditar...Anita era puta velha,
À vista dos granfinos, valia menos que as chagas de uma cadela...
Sorria com dentes amarelados pelo cigarro...
Transava por migalhas...trocados...com velhos, doentes e casados...

Tinha o sexo esquálido...Os sonhos de amor..um a um enterrados.
A honra rompida...e terminantemente perdida...
E para acabar, de orgulho e altivez...falida.

Maraísa Bovary

e4!

closed sicilian

Do intelecto num esforço colossal
Analisava as variantes possíveis
Dispondo-as em diagramas visíveis
Relembrando Fisher, Anatoly e Tal.

O lance que procurava era vital
Para sobreviver a tantos desníveis,
Pensava: serão esses lances criveis?
Enquanto admirava seu bispo mal!

Buscava a ruptura do centro com afinco
E com cirúrgico esmero ataca o flanco!
Calculava o possível mate em cinco.

Espalmava as mãos sobre a face lívida
A Dama eliminava finalmente o rei branco
Seu lance tornou-se um beco sem saída!

Renato de boer.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Vontade

Vontade louca
Correr para rua
Beijar o mundo
Fazer careta
Dar cambalhota
Dizer “te amo”
Para uma pessoa
Xingar um cara
Filho da puta
Que eu não suporto
Tirar a roupa
Tirar a máscara
Vontade louca
De ser mais eu.

Mariana Ribeiro

Atravessado

Para mil e uma razões
Existem mil e uma noites
Todas afastadas
Todas alargadas
Por um tempo de açoites

Escorregando por sonhos,
Todos mesclados e indolentes
Todos tão carentes
Comendo as vigas
Dos homens descrentes

A vida desgastando-se em detalhes
-E quando se está atravessado
Fora do ritmo do êxtase
Trocando cada fase
É quando se encontra

Outro Lado...
Nós em um
Viajando por unanimidade

Correndo por uma cidade
Cheia de tetos e malicia,
Procurando o Mito da Verdade...

Augusto Loffredo

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Alada

Se é para quebrar a cara
que seja em noite
de lua cheia
eu, Godiva, alma nua
galopando no teu céu...

Que me vale tanto zelo,
o medo de quedas antigas
dos falsos amores
em poças rasas?

Prefiro o risco.

Correr por teus caminhos...
entre pedras e espinhos.
No teu sexo, minhas asas.

Agatha R.

Infância

O jantar constituía-se de cuscuz, ovos, café, leite e água gelada - típico jantar teresinense. Pela porta dos fundos, matizando a casa de macieza e saudade, vinha o vento, envolto de orvalho e de perfume: as carambolas sumarentas e maduras; e em breve iria chover.
Então, logo após um súbito rimbombar de trovões, amancebado de um relâmpago diabólico, ela não se conteve:
--- Mãe, é melhor pegar logo as velas, vai já faltar luz! disse, temerosa de que o escuro aterrador que afogava o quintal engolisse a casa.
--- Luz, não, energia! exclamou zombeteiramente o pai, provocando risos da mãe e do irmão.
Destarte, como num violento lampejo, criou forças, e deu um salto da cadeira, amuada e em revérberos de vingança; estava indo procurar as velas, tencionava escondê-las, quando faltasse luz - mas, no meio do caminho, a luz morreu aquilinamente, sem avisar, tendo aí que retornar pra sua mãe, resfolegando, e prometendo a Deus que nunca mais pensaria em maldade.
Chuva.
Diego Melo

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Serenata

Havia
doses de rimas
angústias
pesares
Falava da vida
do tédio
da dúvida...
com jeito de serenata
Havia frases malditas
e outras tantas amargas

Ah! As imagens...
O Diabo parecia
um menino
nos braços da valsa.

Despertei,
com a pergunta
seguida da pausa,

- Você entendeu?
- Nada!...

Estava escutando
a melodia das
tuas palavras.

Giulliana Missel

Papo-furado com Irene

quando cheguei
ela sentou-se ao meu lado
pra bater papo-furado:
arte moderna é chichê,
gosto médio,tanta vanguarda me enche de tédio, sei lá...

ela falou de modismo,de budismo, de novela...
que coisa estranha esse broche no terno,
Chico Buarque é barroco ou moderno?" sei lá...

minha cabeça martelava assim:
valei me ó meu pai oxalálalaiá...

quando voltei,ela falou: punk-rock, hip hop e negritude:
mais atitude é a ordem do dia,menos discurso e mais poesia, sei lá...

e ela ficou repetindo,pô legal bem loco, lindo!,
som de jazzista turista, Caetano,
você faz rock gaúcho ou baiano? sei lá...

minha cabeça martelava assim:
valei-me ó meu senhor do bonfim, lalaiá...

http://www.myspace.com/osskywalkersbanda

Pedro Bizelli

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

A Grande Explosão

no princípio era o caos, ausente, solidão
sem palavras, sem verbos, sem poesia ou rimas
antecipando o movimento da antiga fundação
no extase, no clímax da fricção das partículas

aeons mudos, lambídos pelo gélido libído astral
a dança dos átomos envolvidos na atração natural
matéria excitando anti-matéria num romance espacial
o som do gemído da primeira explosão, o gozo sideral

o nada, que era óvulo desconhecido, consentindo...
a vida em gametas como cometas, intro-metidos
vasto, escuro útero negro, em escuridão acolhidos
espaço aberto em contração esperando a geração da vida

galáxia, planetas parídos do intercurso celeste
o rastro das estrelas de um cortejo inocente
numa noite aclarada, um segundo de iluminação
veio a criança luz galopando no carrossel das constelações

Ian Salvador

Viagem cruta

Corroe-me a alma
Pois há lugar
Problema pouco...
Louco entre...
Abismo______
_____Um navio
Viagem curta
Morfina
Aspirina
Rotina


Lucas Bertoldo

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Cariño

Ven acá, cariño
Ven conmigo
Dame tu mano
Y camina al sol
A mi lado
A mi paso
Despacio

Ven, cariño
Siéntate acá
Acostada en mi brazo
O, si te gusta
Espaldas con espaldas
Cabezas sobre los hombros
Sintiendo y oyendo nuestras almas
Respiración, piel
Cabellos sueltos
En paz

Ven, cariño
Vamos juntos a crear una nueva vida
Vamos juntos a crear un nuevo amor
Vamos juntos, cariño
¡Ven!

Yo te quiero
Pero quiero que vengas libre
Si quieres
Si es para ser juntos, a dos
Si me quisieres amar también

Ven, cariño
¡Ven!

Alexandre Spinelli

Menina Maria

Sou menina Maria, tenho 16 anos,
e procuro um grande amor.
Mas não esses amores comuns não,
não quero nem cavalo branco e nem charrete,
prefiro de tênis velho, mascando chiclete.
Não quero flores e nem lisonjeio,
prefiro dores, e pneus sem freios.
Acho que encontrei um amor assim,
dias desses vi o Guilhermino,
ele com aqueles cabelos brancos, pela neve é velho não,
me convidou para passear.
Mas não fomos tomar sorvete não,
fomos ver o trem andar.
E logo depois matar os ratos do lixão.
Mas fiquei triste, pois apesar de tanta devoção,
obtive respostas não.

Mari Schurr

sábado, 31 de janeiro de 2009

Inversão dos papéis.

Hoje te quero nua, poesia!
De peito e pernas abertas,
Passiva, boquinha fechada,
E uma rosa entre os dentes.

Quero assim, apaixonada.
Com o sorriso no rosto,
Como o desejo do gozo,
Coberta de flores e ramas.

Não me diga de amores,
De mágoas ou dramas.
Venha branda, branca,
Sem métrica e escansões.

Quero sem nenhuma rima!
E que se dane a estética,
A tétrica, a obra prima,
E outras entonações.

Te quero de feitio simples.
De olhar relampejado,
Covinha na bochecha
E um sinal na buceta.

Não me diga de ontem,
De mim ou de outrem.
Faz cara de misteriosa,
De astuta, de jocosa!

Te quero no céu da língua,
Na ponta dos meus dedos,
No meio dos meus erros,
Fazendo parte da bagunça.

Te quero num só close
Dando a cara à tapa,
Lambendo da raspa
Mas sem perder a pose.

Te quero sem rótulos,
Despudorada, sem ética,
Sem bancar a hermética
Ou dar de moça dengosa.

Te quero assim, poesia,
Deitada na minha cama,
Pra eu te chamar de vadia
E fazer uma prosa gostosa.

Jairo Alt

Um silêncio para dois.

Discutir, amor
Só, sobre a sombra
Só se perto as faces
Deixa aos olhos a voz
Entre palavras cegas
Entre sorrisos mudos
Prefiro a pausa
Tão belas pausas
Quando o nós se entende
E a boca da noite cala
Nesse, nosso, silêncio
Que tanto fala

Tâmara Rabelo

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Suor e cama

Meus tragos
Jogam no ar
Pensamentos
E fumaça

Espalhando pela casa
Vazia e pequena
De subúrbio
Vazio e pequeno

Uma nuvem densa
E minha porção de carne humana
Já está de coxas molhadas
Sem imaginar
Que não sou de ligar
No dia seguinte

Sou só
Suor e cama
E Cultivo meus vícios
Entre sal e lençóis

Daniel...

Um Sopro no Jardim

Em obscuridade e estado de sonolência
Entrei e permaneci, no tubo da transição
Num ato de colisão senti que daqui...
Desprendi-me e perdi a lucidez

O ocaso me impulsiona a te conhecer...

Sua face me revela um toque de puro requinte
e em lúgubres estilhaços, desvenda-me
De repente, olho-te! com lacuna impenetrável
Olha-me com fúcsia sinistra
(de quem vê a biografia se degenerar)

Sombras escamoteiam o medo
no cruzamento dos portais...
E dentro de mim impera:
- a solitude calada –

Na distrofia do isolamento...
Conspiram versos desencantados

E da obscuridade alojada...
Conduz-me pela mão a vida, que por ora.
Já não pulsa mais, e torna as mãos vazias

Cobre-me de flores e folhas
Neste jardim visionário...
Leva-me inebriada a existência
e ao sopro de seu toque impetuoso

Liberta-me a alma deste jardim sombrio
Na fonte antes, sagrada e inviolável.
Faz-me caminhar por entre as flores
Como a pomba, com o ramo de Oliveira...

A vida floresce e de novo, regresso a terra.

Sonia Cancine

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Do amor e da Poesia

Não se angustia pela poesia que não vira verso
Ama com intensidade e tudo que advir do teu amor
Será poesia
Parte será repartida do teu desengano para o papel
Parte para teus dedos, parte para teus olhos
Pedaços serão beijos mais poéticos que palavras
Nunca foram. Pedaços serão palavras
Que se perderão no vento
Não disputa tua poesia com o vento
Entende que ele engole
O efêmero, e deixa as ruínas de
Teus poemas para a eternidade

Não tenha vergonha
Da poesia do momento presente
Seja ela poesia de cozinha ou seja
Ela poesia de banheiro
Se não gozar da poesia de cada momento
Por completo
Jamais será capaz de dividi-la
Com o papel. Assim
Jamais poderá dividir
A poesia de teu momento presente
Com o mundo

Não faça versos por vaidade
Se tens vaidade e deseja
A acolhida pública
Escreve novelas, escreve quadrinhos
Não humilhe a poesia à tua necessidade
De aprovação
Não mostre teus versos, não comente
Mantêm eles quietos, submersos
Até o momento preciso
De presenteá-los àqueles que
-Você sabe - esperam ser tocados
Pelo vazio

Mata tua poesia antes de publicá-la
Mata todo o presente e deixa no verso
A possibilidade estática, fria
Para que o calor do presente do próximo
Possa aquecer teu poema
E ele se torne novo
Pelas mãos onde passar

Amém

Diogo Testa

Teu sono

Quando você dorme, tudo dorme
Os talheres na gaveta do armário
Os porta-retratos na estante da sala
As roupas penduradas no varal
O giz riscado no quadro-negro
Os ventos dormem
As águas dormem
Como crianças inocentes
Como as pernas dormentes
Tudo dorme
E eu acordo para admirar o teu sono
A tua Beleza, o teu cansaço.

João Diniz

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

SONETO ÁRCADE PÓS-MODERNO (CARPE DIEM E BLÁ, BLÁ, BLÁ...)

de toda a transitória eternidade,
na pouca liberdade em que se vive,
que do amor minha alma não se prive
e nem se renda ao medo da saudade.

prefira ser abrigo dessas mágoas
e antes sofra as mais agudas dores;
provando dessas cristalinas águas
pra não morrer de sede e sem amores...

para que no fim (se de fato existe)
eu possa olhar pra trás e não chorar
de arrependimento ou de rancor.

pois no mundo não há nada mais triste
do que viver sem Vida e, sem amor,
guardar no peito o que se quer gritar...

Lucas de Oliveira

Questão

Cai a noite.
Tombam corpos na
Inércia,
morro aos poucos...

Ausento-me de tudo
e distancio
do que ao mundo
represento.

Desperto!
Mergulho no vazio,
liberta
no abandono

E vejo
o ser exposto
ao avesso
que me despi.

E de espanto,
pois recordo do
que estou
adormecida
no tempo

Pergunto:

O que sou,
senão
essa questão
que me
persegue?

Maris.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Sobra

Não pensa nu mundo
Feito fruta descascada
Que aguarda ser comida.

Em vez disso
Meta saliva nas feridas
Das ruas sem saída
Que te levam à cama do quarto.

Vanglorie-se dos problemas
Como fonte inesgotável de riquezas
Super-fulas! Adoráveis.

Crie um altar
E contemple o caos da vida
Como ao nascimento
De um transa despretensiosa

E espera em segredo
Um dia transparente
Onde o mais ridículo dos atos
Possam te transformar em orgulho
De ser odor nas palavras.

Bruno...

Tão Só

E hoje ali, na mesa de bar
bebida e nostalgia
fiel companhia
nunca me deixa sozinha.

Olhava a mesa ao lado
casal de namorados
beijos apaixonados
a cena que via, me matara

Minha alma gritava
chorava
e solução não existia
Não tinha você ao meu lado

Fim de tarde, a bebida
me acompanhava, relaxava
já não sentia gosto por mais nada

Triste, desanimada.
À espera de um encontro de almas
que complete a minha.

E amanheço ali
bêbada em lágrimas
Tão só!

Breila Marcante

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Soneto do "aspone" punheteiro

Na gravata e no pisante italiano
um aspirante às cadeiras da justiça
diz que vai fazer direito no outro ano
pra livrar-se dessas pragas da cobiça

Comportado atrás da mesa à caneta
vão os dedos agitados noutro ofício
de trazer ao pobre "aspone" na punheta
o consolo do cansaço e sacrifício

Alternando entre o labor e o prazer
resfolegando sobre laudas e ofícios
sonha ele com o amor mas sem saber

se mais vale uma punheta proibida
que não cabe e nem abunda orifícios
ou se é mesmo o amor que ganha a vida!

Monica San

O Homem da rua

Fui atirado na sarjeta da sorte,
sem dinheiro, sem roupas, mas com vida.
Enfim, a rua sempre me convida,
Para saborear um belo banquete com a morte.

Augusto Cerberus

domingo, 25 de janeiro de 2009

Véu

Se esse problema é só teu
a cruz do teu eu
teu erro pra viver em paz

E se o remédio é de Deus
e quem que escolheu
um samba pra tocar em jazz

Eu sei que tudo é tão bonito no papel
mas sei, também, que o teu amor não é só meu
não sobe no palco, não grita pro céu

Não tem casamento, com lua de mel
só ama vestido de lua,
na sombra de um véu.

Arthur Vital
Ouça esta canção no myspace do autor.
http://www.myspace.com/arthurvital

Cansaço de Amor Cansado

Tenho estado cansada de não escutar sua voz, e depois de tanta vontade e insistência, ter sua voz fria a fios de distância se torna pesado.
É ruim ver de longe ou não ver o que se passa.
Eu quase mal mastigo a aflição de que pode ter um alguém outro.
Tenho estado cansada de tanta falta de tempo, de tanto tempo sem papo.
Não mais dar tempos.
Os tempos que se dão, que dêem uns aos outros, os tempos que se danem.
Me sinto, sinto muito, mas ainda assim, é muito tempo sem ter-te, e se acaso ter-te ser só dois dedos, ser só de passagem.
Tenho estado cansada de receber-me fria, de não escutar, de não ler-me em palavras bonitas.
Não posso mais achar plausível ler palavras antigas para me convencer que minhas queixas são penúria e que de ti tenho barriga cheia.
Tenho estado cansada de ter certezas guardadas que me são como incertezas juradas de desgosto.
Não posso mais com menos nada.
A cada segundo, a cada tempo que passa eu quero mais você, mais a gente.
Mais estrada, mais tempo pra eu decifrar você inteira.
Pra eu ter uma variedade de gestos, uma variedade de beijos, uma coleção de hálitos.
De menos, o único que almejo, é ter você menos cansada.
Ingrid Regina.

sábado, 24 de janeiro de 2009

Do meu diálogo claustrofóbico

Enfrentar os medos, foi isso que o psicoterapeuta disse. A escada seria uma boa alternativa, mas não: Enfrentar os medos. O suor gela a testa; os meus tiques se revelam; as luzes passam de um andar para outro...
- Agora: entra. - A porta se fecha, as paredes também.
- Conta: 1, 2, 3, 4.
- Conta: 1, 2, 3, 4.
- Inspira, expira, inspira, expira.
Sétimo andar, oitavo, nono...
- Calma. Décimo.
- Fora.
O doce cheiro dos corredores.

Alexandre Cruzeiro.

Prometeu

Estou longe, muito longe de tudo...
Aqui no alto mar
Ultrapassamos o verniz superficial das coisas.
.
Filtro cores por dentro d'água,
Entre peixes palhaços e morcegos.
Flutuo na densidade da água em sal.
.
Pintados, arraias
Cavalos marinhos e caraúnas azuis
Bailam por entre porões d’um antigo naufrágio.
.
Entre um oceano que gotejava
Tintas de azul,
Numa imersão Dantesca.
.
Embriaguei-me no êxtase das ondas
E deixei-me flutuar no farfalhar das brumas do inconsciente.
O sol deixou-me dissonante.
.
Enquanto garças sobrevoavam e devoravam meu fígado
Por inúmeras eras, mas eu como um titã me regenerava.
.
Hércules meu amigo, abateu aquela ave de rapina.
Enquanto Netuno galopava com um olhar irascível,
De longas barbas a apontar-me com um tridente na mão.
.
Já Refeito, roubei do céu uma centelha de fogo
E guardei-a na haste de uma férula.
.
Prometi que levaria essa chispa à terra entre trutas e garoupas
A todos os seres de livre arbítrio.
.
O resto é Prazer e Fome
Sobra, Ruptura e Náusea!


Marcos Moura.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Transposição

Tomarei a desgraça por pilhéria
Na decomposição da noite escura
Ao me entregar nos braços da natura
Como um filho que volta da miséria.

Eu desmantelarei essa armadura
Da hipocrisia que se mostra séria
E no desmembramento da matéria
Eu só darei valor à idéia pura!

E sem raiva, nem medo, nem tristeza,
Nem qualquer sentimento que destrua,
Ao mundo ostentarei minha alma nua

Que, mergulhada no éter do meu ser,
Foi transposta da sua natureza
Para os versos que agora estás a ler!

David Moura.

Confusão

Era quase um uivo aquele lamento. Prece chorosa de um descontentamento.
O incômodo, o desconforto de um coração que bate "meio morto" num peito cansado de caminhar por essa trilha, que nada mais é pois, que os dolorosos caminhos do amor...e este, de tudo nos faz fazer.
Choramos, sorrimos...tropeçamos em tudo, até em palavras.
Erramos, padecemos, sofremos.
É pois, faca que rasga corpo e faz fendas na alma. Caminho penoso é o que é...e, se não for assim, [amor] é que não é
....Era mais que um um simples uivo...prece triste em agonia, do mais duro desencanto, bem mais que um lamento, era.
Quase vergonhoso pranto, debatendo-se em teimosia...a de insistir no amar. Amar...[gurado] sentir, ruím e bom de existir. Pensava que feliz eu era, mas infeliz, me fizera...e, se era, por que não sou?
Porque o amor é assim: Não veio explicar, não é fácil de entender...e é rápido em confundir.
Agora chora peito. Porque é seu esse direito.
Padece, criatura. Porque a cana é doce, mas é dura!

Rosana Lazzar.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Elegia do abandono

Ante teus olhos minha alma impura, mas transparente
E a atravessaste como o fio de uma espada
E a olhaste como se ali houvesse nada
Sequer viste qualquer desvairada, mendiga ou indigente

Feriste-me outra vez, e nem te amaldiçôo
Mas por teres me abandonado novamente
Por teres tua alma afastado de mim de repente
Por isso, Maria, também não te perdôo

E por não teres me confortado quando em teus braços
Por não teres me acariciado se ao alcance dos dedos
Por não teres me ofertado um de teus sorrisos escassos
Por não teres ofertado teus ouvidos a meus segredos

Por não teres dado refúgio à inocência da pouca idade
Por não teres te perturbado com a silenciosa conduta
Por não teres percebido minha miséria absoluta
E por teres confundido tristeza com maldade

Ah, por não teres me doado um pensamento neutro
Nem, por um instante, dedicado um resquício de doçura
Minha alma tem num calabouço aprisionada a ternura
E também o teu perdão dorme profundamente lá dentro

Iriene Borges

Retrocesso

O poema nunca estará feito
enquanto não se findar o que sinto,
o objeto transcende o sujeito,
o sangue colore o vinho tinto.

Palavras se escrevem
com meio, início e final,
mas mágoa é sinal:
rios lentos não cedem.

Quisera encerrar a voz que me envolve
como se mata um poema, golpe por golpe,
mas a mágoa é eterna, cadência infinita
e a dor é pulsante, precede a própria vida.

Não quero parecer, contudo,
um toador do revés,
quero, ao invés, parecer com tudo,
abrir meus olhos,sonhar através.

Mas, desejo, terás de esperar.
Quanto maior a esperança,
mais a mágoa avança,
insiste em não acabar.

E, pra calar sua voz,
tenho um ponto final,
e esqueço que o fim
é apenas sinal.

Eric Schnaider

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

POEMA PARA QUE ENLOUQUEÇAS

Que meu poema chegue aos teus ouvidos
Com a fúria e persistência das ondas
Ante a arrogância dos rochedos

Que rasgue a pele da tua carcaça
E penetre teu corpo rígido
Como o primeiro raio da manhã

-Até arrancar de ti o gozo do entendimento -

Que torça teus sentimentos
Como roupa lavada
Pra que deles escoe tua verdade escondida
Em lágrimas salgadas de dignidade

Que espalhe palavras de amor
Em teu árido terreno
Verdejando de delicadeza
O campo minado de tuas defesas

Que as raízes e ramos das palavras
Desativem as bombas que escondeste
Pra explodirem sob meus passos de angústia

Que transforme dor em riso insano
Pra lembrares de tua loucura tão negada

Que arranque tuas vestes
E enudeça tua vergonha
Começando por desatar
o nó de tua gravata forca

E que essas mesmas raízes
Enrosquem-se no corpo de teus mortos
E os traga vivos à superfície
Pro derradeiro acerto de contas

Que enlouqueças um pouco com meu poema
Pra aprenderes a rir de teus valores torpes

Que meu poema te faça menino
E deboche de tua retórica vaidosa
Escorrendo entre teus dedos qual sorvete derretido

Que meu poema te dê asas
E coragem pra voar
Derretendo o chumbo de tudo o que recalcaste

Que desça em tua garganta
Como calda de chocolate
Neutralizando o fel dos teus afetos tortos

Que meu poema seja bússola
Na escuridão de teus inúteis conceitos
Embaralhando as letras de teus livros de leis
reciclando-as em sonetos de amor

Que meu poema seja jangada
De volta a cada fim de tarde
trazendo sorrisos e alimento
Mas sobretudo
Trazendo-te de volta
Inebriado de poesia
E saudade

Que meu poema seja teu novo código de ética!

Cado Selbach.

Sonho de Pano

.

Espera ansiosamente o fim, pra cumprir o trato, mesmo tanto incomodada pelo roço da pele enrugada, o cheiro de álcool e as reações da vulva que se tornou mais sensível as estocadas do velho, depois de menstruar pela primeira vez. Agüenta paciente.

Tragada pelos dedos grossos, seus poros se rendem ao toque forte, em seus ouvidos resfôlegos dançam com gemidos. Seus olhos brilham, deslumbrando a boneca de pano com sorriso bordado, encostada na cabeceira da cama.

Ensejando a companhia doce e o pano macio, olha a tarde pela janela, se não escurecer brinca com ela ainda hoje. Nessa visão laranja sonha com a recompensa, por enquanto trêmula a alguns palmos do seu rosto.

Finalmente acabado, espera quietinha o velho fechar o zíper e atravessar a porta. E então corre e segura forte a bonequinha entre os braços.

Cochicha em seu ouvidinho costurado:

- Tá tudo bem, agora eu vô cuidá de você...

André Ulle.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Vigília

rasga
a fenda
que você
me remenda

folga
poro por poro...
abusa ao tocares
toda linha do visado

reza
a lenda
que você
me desvenda

prova
gole por gole...
suga nos altares
toda vinha do pecado

Cris de Souza

Prosa sem nome

Vou seguir em frente, Tereza. Te apagar, esquecer o seu nome. Tanta sede, tanta fome. Estava a ponto de morrer. E pra que, Tereza? Pra nada! Mendiguei tanto o carinho teu, que na minha fala só tem carência. Estás tão presa em sua demência? Não enxerga nada além? E volta agora vociferando mil palavras duras. Pois que seja, nada dura. Vou me embora sem você. Adeus, Tereza. Boa sorte no viver.

Onzemesmo.

Embriaguez

Como ácido,
Desceu conhaque..
Não houve,
espasmos...

A luz da praça
Ainda forte reluz
Uma graça!!
Ou será do sol?

Como agulhas...
Senti o conhaque...
Perfurando meu lábio...
Depois do beijo roubado...

Ainda sem efeito
Sorvi mais uma vez
O tenebroso presidente...
(ou seria, senador?)

Como leite...
Entrou o conhaque...
Corpo adentro.
Sonolência.

A parede de repente...
Surgiu na minha frente...
Opa, vem a reação...

As tripas deram nó...
E como que chutado...
O presidente, banhou o sapato.

Maraísa Bovary

Códices do Inferno


Em homenagem ao ódio, à fúria e a tantas outras guerras...

Como a carnificina clamada aos cantos
Cortejo cada cálice do caminho célere,
Comandando capitães ao meu colligiere
Contrapondo o claustro de ermos confrontos.

Cristos confundem os códigos de conduta,
Crucificando cada celebre e cruel cidadão
Convém caluniar o crânio do vil cão
Com a chuva de cada crisálida cicuta.

Cádmio vermelho colori e ceifa os céus
Condicionando o carbono a consagrar
Copulando com o clamor de contra-provar

Creio na congregação da coesão colérica,
Cada canto que calígrafo com clava cadavérica,
Calvário este cravejado de camafeus.

Renato de Boer.